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domingo, 29 de agosto de 2010

Pensar...

Pensar é uma tarefa arriscada. Implica a cons ideração de espaços complexos e tempos múl t iplos , a formulação do que não se apresenta verossímil à primeira vista e a aceitação de que as elaborações resultantes da atividade intelectual são irremediavelmente provisórias, instáveis e lacunares. Nestes termos,
pensar é um exercício que supõe a aceitação das limitações do pensamento, saber que se pode não
saber e que o impensável e o imponderável são dimensões constituintes do conhecimento.
É no limiar das proporções geradoras do conhecimento, confi guradas entre o estranhamento sobre o atual e o reconhecimento dos trânsitos que a dissertação de Mestrado, vinculada a linha de pesquisa cotidiano escolar da Universidade de Sorocaba/SP propõe, como objeto o pensar, mesmo que provisório, sobre as signifi cantes da tensão entre a cultura analógica e a cultura digital. Este exercício implica em imergir num cenário instável e precário de passagens, para perceber aqueles elementos singulares que estão em trânsito no universo escolar, numa sociedade que gesta uma cultura marcada pela propagação generalizada de dimensões virtuais, via redes telemáticas, expandindo-se em instâncias cada vez mais diferenciadas da vida
social, como as atividades econômicas, o lazer, a comunicação, a gestão dos corpos, a medicina e o esporte, entre outras. Por conseqüência, indagar como a escola trabalha, em seu cotidiano, com Cabeças Digitais insurgiram em decorrências perceptivas e cognitivas que puderam ser apenas intuídas. São apenas indícios e sinais que se evidenciam nos enunciados verbais mobilizados para a montagem do cenário dissertativo apresentado.
Seguindo os paradigmas indiciários proposto por Ginzburg (1991), através de uma pesquisa
bibliográfi ca, sobre as transformações cotidianas na sociedade, o trabalho em questão, pautado
nas pesquisas de Octavio Ianni (1998), tratou sobre as mutações culturais desde o período
medieval, cujo domínio estava sob o Principado de Maquiavel, passando pelo Principado de
Gramsci, alcançando, desta forma, a contemporaneidade, agora sob dominação do Principado
Eletrônico. O principal objetivo foi o de desvelar as alterações que ocorreram na cultura humana.
O levantamento dos indícios sobre a evolução da sociedade e a respeito da mutação do sujeito,
tornou-se um arcabouço vital para enxergamos como a saturação de tecnologias no cotidiano
com especifi cidade para as Tecnologias Midiáticas e Digitais de Informação e Comunicação, a
partir deste ponto TMDICs, descortina uma sociedade fundamentada em características tecnológicas
que nos permitem considerá-la como uma Sociedade Digital.
Dialogando com Lucia Santaella (2004) e Derrick Kerchove (1997) sobre os indivíduos que vivem
sob a infl uência das TMDICs na Sociedade, já considerando esta Digital, no trabalho buscou-se,
também, mostrar como as TMDICs têm produzido alterações na forma dos sujeitos ocidentais
perceberem e interpretarem a realidade, revelando como os meios tecnológicos, a partir do
surgimento da mídia televisiva, alteraram o perfi l cognitivo dos sujeitos de Tecnopsicológicos em
Psicotecnológicos, permitindo, a partir da refl exão realizada, inferir que os sujeitos hodiernos
internalizam os sistemas de controle, o que os faz pensar de maneira digital, transformando-os,
por conseqüência disso, em Cabeças Digitais.
Diante do cenário exposto, perceber como se dá a inserção das Cabeças Digitais na escola
tornou-se uma questão crucial. Indagação esta que permitiu a visualização do contraste
entre o sujeito, como Cabeça Digital, e seu cotidiano escolar que, por conseqüência das práticas docentes lineares, (re) produtivas e reguladoras
do processo de educação formal, se mostrou analógico. Tal percepção só foi possível através das
análises dos dados coletados na pesquisa de campo realizada com alunos e professores que fazem
e atuam no cotidiano escolar sorocabano onde, com uma pesquisa apoiada, na sua metodologia,
em questionários estruturados e a aplicação da técnica do grupo focal, emergiu a dicotomia
existente nas formas na qual o cotidiano escolar se apresenta para alunos e professores.
Em síntese, a resultante das operações das pesquisas teórica e empírica, permitiu a construção
de uma moldura que funcionou como baliza para o tema retratado. Nesse sentido, as
especifi cidades permitiram-me dizer que o surgimento da escrita retirou do mestre os conhecimentos
que até então eram circunscritos ao seu pensar. Tal tecnologia introduziu novos
mecanismos no processo de ensino-aprendizagem, pois os discípulos já não precisavam confi ar
apenas na própria mente e na de seu mestre: o que precisava ser conhecido estava escrito. Com
o surgimento da imprensa, a geração de várias cópias de um mesmo impresso, a partir de uma
matriz, propiciou estar a mesma informação em diversos lugares ao mesmo tempo. A invenção
da prensa mecânica fez surgir o jornal, a primeira mídia capaz de abraçar uma enorme quantidade
de pessoas ao mesmo tempo, assim noticiando fatos do cotidiano, revelando informações
curtas e momentâneas.
...Diante da perspectiva de análise, produzida e desenvolvida para esta investigação, um
aspecto atravessou de modo disseminado todos seus instantes: a condição atual renova desafi
os para o pensamento, renovando ao mesmo tempo os temores e os discursos saudosistas na
escola, empenhada em recuperar a estabilidade e a confi abilidade associadas, pelo menos do
ponto de vista das narrativas dos professores, a um cenário anterior. Entretanto, sinalizando
de modo enfático, que está em curso a emergência de um novo sujeito, de um novo lugar, de
novas demandas, ainda que de natureza difusa, incorpórea e sem contornos bem defi nidos, as
Cabeças Digitais, dilatam, exigem e incitam a incorporação, na escola, da cultura implicada nas
TMDICs. Entendo ser esta a questão contemporânea, a da inscrição rizomática de uma inteligência
coletiva nos aparelhos, trazendo como contrapartida o redimensionamento das atitudes
e dos saberes por parte dos membros da escola como sua própria condição existencial.
Na indiscernibilidade coreográfi ca da contemporaneidade, podemos inferir, concordando
com Santaella (2008) que vivemos um presente de puro interstício. O que nos permite, então,
concluir, com André Parente (2006, p. 67), lançando mão da seguinte questão: quem se
lembra de Proteu? Proteu é um mito fractal. Cada uma das perguntas que sua fi lha faz sobre
sua identidade, ele se metamorfoseia: Proteu é água, é fogo, é pantera. Mas, quem é Proteu
quando ele não é mais água e ainda não é fogo, não é pantera? Puro interstício: é ponto, é
linha, é plano, é volume e é tempo. Cada aparição sua é uma possibilidade de resposta local
e uma impossibilidade de resposta global, transitando entre o contínuo e o incontínuo, entre
a ordem e a desordem, o campo e o contracampo, como aquelas radicadas nas operações de
composição e montagem desta dissertação. É como se esta dissertação respondesse à questão
sobre a identidade de Proteu com a dimensão temporal da contemporaneidade, momento de
reconfiguração de muitas fronteiras e limites: real/virtual, sujeito/objeto, presença/ausência,
realidade/ficção. Quanto as atuais práticas docentes e as incitações discentes resta trazer Jorge
Luiz Borges (1974): O tempo é o rio que me carrega, mas eu sou o rio: é o tigre que rasga, mas eu sou o tigre: é o fogo que me consome,
mas eu sou o fogo...
REFERÊNCIAS
BORGES, J. L. Obras completas. Buenos Aires: Emecé, 1974.
GINZBURG, C. Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. São Paulo: Companhia das Letras,
1991.
IANNI, O. O príncipe eletrônico. Primeira versão, Campinas, p. 1-30, nov. 1998.
KERCHOVE, D. A Pele da cultura: uma investigação sobre a nova realidade eletrônica. Lisboa:
Relógio D´Água Editores, 1997.
PARENTE, A. Figuras da paisagem: estereoscopia. In: FAVORELLI, A.; BRUNO, F. (Orgs).
Limiares da imagem. Rio de Janeiro: Mauad X, 2006.
SANTAELLA, L. Navegar no ciberespaço: o perfi l cognitivo do leitor imersivo. São Paulo:
Paulus, 2004.

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